27 DE ABRIL 2020

 

 

1. Conforme afirmado há mais de um mês pela Associação Amigos da Grande Idade é grande prioridade do combate ao COVID 19 deveria ter-se centrado nos lares de Idosos. Não o foi e hoje deparamos com mais de 40% dos falecimentos ocorreram em lares de idosos. Esta percentagem tende em aumentar muito, podendo chegar-se a números que vão chocar toda a sociedade.

2. Como se percebe a estratégia para os lares de idosos é de grande desorientação, não se conseguindo um planeamento nacional com acções preventivas. A estratégia tem sido desenhada por resposta a ocorrências que vão surgindo, que se vão tornando evidentes e publicas através da comunicação social. Começou-se pelas tendas e pela dificuldade em definir quem devia ser transferido. Primeiro transferiram-se pessoas infectadas e depois, correctamente, pessoas não infectadas. Depois passámos aos testes. Iniciaram-se em zonas em que o COVID apresentava números menores (Alentejo e Algarve) e pelos residentes de lares. Agora e correctamente parece que se vão iniciar aos trabalhadores de lares, únicos agentes há quatro semanas para cá que, de facto, podem transmitir o vírus, dada proibição de visitas. Ainda mais recentemente lá vieram as preocupações com o confinamento e as visitas, ainda não havendo decisões sobre esse problema.

3. A desorientação é de facto muito grande e ainda que possa ser justificada em parte pelo inesperado da situação, não deve deixar-se de pedir responsabilidades a quem detém conhecimento total da situação e autoridade nacional para resolver problemas. Um dos exemplos é a última medida que envolve os centros de saúde e a sua potencial necessidade de intervirem nos lares. Ora a Associação propôs intervenção nos lares ilegais e não julga essencial a intervenção em lares licenciados que tem a obrigação de ter enfermeiro e que habitualmente tem médico (ainda que a legislação não obrigue a isso). Mas é do conhecimento de todos os técnicos de lares que os centros de saúde nunca estiveram vocacionados para esta intervenção, sendo mesmo difícil o seu apoio quando os lares o requisitam, escondendo-se em incapacidade de recursos humanos e em legislação apropriada. Ora agora à pressa e em mais uma acção de marketing vem dizer-nos que os centros de saúde vão intervir em lares. Mas que lares? Em que áreas?

4. Ficamos também admirados com a notícia da impossibilidade de enfermeiros do SNS acumularem funções em lares de Idosos e perguntamos; o SNS paga exclusividade aos enfermeiros? Então os mesmos não podem desenvolver a sua actividade paralela onde desejam através de recibo verde ou de outra forma de contratação? Podem os médicos? Ou será que tal notícia é para justificar as falhas das instituições sociais no que respeita à existência de enfermeiros sabendo-se que grande parte delas não cumpre os rácios que se encontram na legislação. Será que agora vão dizer que não os cumprem porque os enfermeiros são proibidos de trabalhar nas IPSS?. Já assistimos a justificações mais sérias e não entendemos este alerta nesta situação especial.

5. Há conclusões que já devem ser tiradas:

a) Necessidade urgente de análise e alteração significativa da legislação dos lares;
b) Repensar sobre a autoridade, coordenação, fiscalização e regulação dos lares integrando a área da saúde que deve complementar ou mesmo substituir a área social nos actuais lares com o modelo que tem e que dão resposta especialmente a pessoas doentes. Criar outras tipologias que dêem resposta a pessoas exclusivamente com problemas sociais ou de opção de vida colectiva,
c) Alertar modelo de comparticipação tratando lares sociais e lares privados de forma igual.
d) Alterar o modelo de intervenção previsto para os lares.
e) Integrar nesta análise e alteração a rede nacional de cuidados continuados que, como se está a verificar, foi completamente anulada neste processo COVID 19

6. E há preocupações que continuamos a manter e que continuam a ser esquecidas pelas entidades por falta de coragem e também de rigor. Trata-se dos lares não licenciados. Começamos a receber noticias, não confirmadas, nunca confirmadas, de mortes em lares não licenciados que passa, ao lado de qualquer registo ou controle. Existem cerca de 3000 lares não licenciados onde se encontram perto de 50.000 pessoas idosas. E nada se faz? As entidades oficiais dizem que desconhecem o que não é legal e defendem especialmente a segurança social que será confrontada com o facto de estes lares existirem sem que tenham intervido. No interior dos lares não licenciados vive-se um drama: não se expõem porque acabam com o seu negócio não licenciado, tem receio de sofrer represálias e vão escondendo a realidade.

7. A Associação reflecte: se a percentagem dos falecidos é tão elevada para os lares licenciados, não existindo registo de falecimentos em lares não licenciados, então será melhor passarmos a ter lares não licenciados. É, pelos vistos onde não morre ninguém. Mesmo sabendo que em quartos onde devem estar duas pessoas, estão seis, que não existem mais de uma ou duas auxiliares para cuidarem de 20 e 30 pessoas, incluindo fazer a alimentação e a limpeza do lar, que estas pessoas fazem as refeições nos cadeirões em cima umas das outras, que não existem quaisquer circuitos de lixos, de limpos e de sujos, que muitas vezes não tem enfermeiros durante semanas, que o estado de nutrição das pessoas passa por jantar de um pão com manteiga e uma caneca de leite com café, etc.

8. É pois fundamental a entrada nestes lares e a Associação propôs há muito tempo que esta intervenção deveria ser liderada pela autarquia local que constituía equipa de observação e depois de listar todos os lares nestas situações na sua região, visitava-os com autoridade policial e forçando entrada com justificação pelo estado de emergência, registando as pessoas que lá vivem, a sua situação, o numero de mortos já ocorrido e aplicando testes o mais rapidamente possível. Aqui justificava-se a intervenção dos centros de saúde de imediato, liderando as intervenções. Isto será salvar vidas que é o que necessitamos. As consequências logo serão tiradas. É urgente, é obrigatório, é uma responsabilidade nacional e todos seremos coniventes quando depararmos com mortes evitáveis nestas unidades.

A Associação não quer ter razão nem ficará feliz com isso. Mas tem alertado para várias situações que se veem a concretizar.