Pessoalmente nunca gostei do termo “geringonça” com que a solução governativa foi cunhada de forma infeliz numa crónica de Vasco Pulido Valente. De acordo com o dicionário Priberam³, significa:
“Coisa ou construção improvisada ou com pouca solidez. = CARANGUEJOLA. Aparelho ou mecanismo de construção complexa. = ENGENHOCA. Confundir uma solução governativa legítima contemplada no quadro
constitucional com uma engenhoca,é má fé ou enviesamento ideológico.
Mas os portugueses gostaram manifestamente da solução, como mostram os dados disponibilizados pelo Inquérito Social Europeu⁴. A percepção dos portugueses sobre a sua felicidade, a satisfação com a vida e a satisfação com a forma como o Governo está a governar, atingiu em 2017 valores médios nunca antes registados.
Na satisfação com o Governo, Portugal foi o país europeu onde se registou o maior aumento entre 2014 e 2017, 3,01 e 5,02, respectivamente. Este aumento não tem paralelo com o que se passou entre 2002 e 2014, reflectindo estes valores, sem dúvida, a expectativa positiva com a mudança do governo, pois embora este survey tenha a data de 2016, em Portugal a recolha dos dados ocorreu entre o fim de 2016 e 2017. Ou seja, a opinião dos portugueses sobre a governação está consolidada.
Relativamente à satisfação com a vida e à felicidade, regista-se também um aumento estatisticamente significativo. A posição relativa de Portugal relativamente a estas duas dimensões do bem-estar subjectivo mantém-se relativamente estável desde 2002. Não admira, pois, a percepção do bem-estar subjectivo tem características estruturais e varia pouco ao longo do tempo. No entanto, é de sublinhar o aumento verificado. Note-se ainda que as respostas a questões deste género são muito influenciadas pela idiossincrasia do país. Por norma, os portugueses não respondem nas “pontas da escala”, são moderados nas respostas. Nem se sentem muito mal, nem muito bem, antes assim-assim.
Já a satisfação com o governo é uma dimensão conjuntural, que pode registar um aumento significativo em face de uma situação considerada extraordinária, como é o caso e nada garante que se mantenha se os portugueses se sentirem defraudados nas expectativas que depositaram na mudança de ciclo. Como se sabe, a oposição não ganha eleições, o governo é que as perde. Estes resultados, ao mesmo tempo que traduzem a aprovação da actual solução governativa, traduzem também, uma insatisfação profunda com a situação anterior.
Os quadros seguintes* evidenciam estes resultados:
Rui Brites²
¹Publicado no Diário As Beiras em 13/07/2018. http://www.asbeiras.pt/2018/07/os-portugueses-gostam-da-geringonca/
² Sociólogo e professor universitário (rui.brites@outlook.com)
³https://www.priberam.pt/dlpo/geringon%C3%A7a
⁴ http://www.europeansocialsurvey.org .Os dados respeitantes ao round 2016 foram recolhidos em Portugal entre o fim de 2016 e meados 2017.