Os jovens e o debate do envelhecimento

Mai 20, 2025
Os jovens e o debate do envelhecimento

Falar sobre envelhecimento enquanto se é jovem pode parecer, à primeira vista, deslocado ou até mesmo desnecessário.

Afinal, o envelhecimento costuma ser associado à última etapa da vida, a uma fase que julgamos distante, que acontece “aos outros”. Mas, essa perceção é, em si, parte do problema.

Os jovens devem falar sobre envelhecimento. Porque o envelhecimento é uma experiência humana universal, mas profundamente desigual. A forma como cada pessoa envelhece está condicionada por variáveis sociais, económicas, culturais e políticas que se acumulam ao longo da vida. Assim, discutir o envelhecimento desde cedo é, na verdade, refletir sobre o tipo de vida que estamos a construir — individual e coletivamente.

A juventude é muitas vezes associada à liberdade e ao futuro. Mas é também um tempo de decisão e de ação. A juventude não é eterna, mas a responsabilidade social pode e deve ser cultivada desde logo. A indiferença atual perante os problemas das pessoas idosas — como a solidão, a pobreza, a exclusão digital, os abusos, a falta de direitos— prepara o terreno para que esses mesmos problemas nos atinjam mais tarde, caso nada mude. Por isso, o silêncio da juventude perante as questões do envelhecimento não é neutro: é um adiamento da mudança.

Além disto, as políticas públicas que hoje são debatidas e implementadas nas áreas da saúde, do trabalho, da habitação, dos transportes ou da segurança social, têm impacto direto na forma como as gerações futuras irão envelhecer.

Toda a luta política e social pela valorização dos jovens é, sem dúvida, essencial. É bom que os jovens tenham acesso gratuito ou mais barato aos transportes públicos, que beneficiem de descontos em diversos serviços, que existam incentivos à sua autonomia, isenções na compra da primeira casa, etc. São conquistas importantes num país que precisa de apoiar as novas gerações.

Mas é profundamente preocupante quando esses direitos parecem estar reservados apenas à juventude. Quando a sociedade se organiza como se os direitos tivessem prazo de validade. Como se, ao envelhecer, uma pessoa deixasse de merecer acesso, dignidade, oportunidades.

É aí que falta uma pergunta crucial: e depois?
Ainda bem que hoje tenho estes direitos, mas quando envelhecer, terei os mesmos? Terei algum direito?
Terão sido pensadas políticas públicas que me garantam qualidade de vida também nessa fase depois destes anos todos?

É importante que os jovens celebrem as suas conquistas, mas é igualmente urgente que se olhe para o futuro com espírito crítico. Uma sociedade verdadeiramente justa é aquela que protege todas as idades — e não apenas quem ainda é “útil” ao mercado. Porque o que está em causa não é a juventude ou a velhice: é a dignidade humana.

Se os jovens se abstêm de participar neste debate, perdem a oportunidade de moldar o seu próprio futuro. Participar desde já na construção de políticas públicas inclusivas e sustentáveis é garantir que o envelhecimento será um direito e não um risco social como nos dias de hoje.

A culpa não é dos jovens, nem pouco nem mais ou menos. A culpa está acima dos jovens. Mas, já o meu pai dizia: “Queres as coisas bem feitas, fá-las tu”.

É urgente que os jovens se envolvam neste tema. Falar sobre envelhecimento é, no fundo, falar sobre o que valorizamos enquanto sociedade e sobre o que queremos preservar para o futuro. Que tipo de comunidade queremos construir? Que tipo de apoio queremos garantir quando nós próprios tivermos 60, 70 ou 80 anos? Que imagem do nosso próprio envelhecimento temos?

Envelhecer em dignidade começa agora, com escolhas, com escuta, com diálogo. É hora de perguntar: queremos envelhecer em quê? Num mundo que se esquece de nós ou numa sociedade que cuida de todos, desde o início ao fim? A juventude tem força, tem voz e tem a oportunidade de não repetir os erros do passado. Que a use para construir um envelhecimento com direitos, com humanidade e com esperança. Hoje.

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Envelhecimento: Um Desafio Estrutural

Mai 19, 2025
Envelhecimento: Um Desafio Estrutural que Exige Respostas Qualificadas e Sustentadas

Portugal é hoje um dos países mais envelhecidos da Europa e do mundo. O aumento da esperança média de vida, conjugado com a persistente baixa taxa de natalidade, configura um profundo reordenamento demográfico que exige respostas estruturadas e sustentadas. O envelhecimento populacional não é, em si mesmo, um problema, é antes uma das grandes conquistas civilizacionais. O verdadeiro problema reside, em nosso entender, na ausência de políticas públicas à altura dos desafios que essa nova realidade impõe.

Entre esses desafios destacam-se: o aumento das situações de dependência funcional e de solidão, o risco de exclusão social e institucionalização, o subfinanciamento das respostas sociais e de saúde, a fragilidade da condição dos cuidadores informais, a escassez de profissionais especializados e a persistência de visões estigmatizantes sobre o envelhecimento. Este panorama reclama medidas intersectoriais e integradas que promovam a autonomia, a participação e os direitos das pessoas ao longo do curso da vida.

Neste contexto, é imperioso qualificar todos os que intervêm nesta área. Não basta querer, é preciso saber. O cuidado ético e competente exige mais do que boa vontade ou experiência empírica. Exige conhecimento técnico, sensibilidade relacional e formação especializada, tanto na fase inicial como ao longo do exercício profissional. Cuidadores informais, auxiliares, técnicos e demais agentes devem ter acesso a formação contínua, supervisionada, centrada na pessoa e fundamentada nos princípios dos direitos humanos e da justiça social. A supervisão profissional, enquanto espaço privilegiado de análise crítica, suporte técnico e desenvolvimento ético, é igualmente essencial para assegurar práticas reflexivas, proteger quem cuida e promover respostas de qualidade.

A ausência de formação e de supervisão ou a sua desvalorização fragiliza a intervenção, expondo tanto cuidadores como pessoas cuidadas a riscos éticos e relacionais com custos humanos muito elevados.

Investir na capacitação de quem cuida é, afinal, investir na construção de uma sociedade mais justa, solidária e preparada para o futuro. É reconhecer que o cuidado não é um ato espontâneo, mas uma prática complexa, que exige competência, responsabilidade e suporte institucional. Porque envelhecer não é um problema — é uma conquista coletiva. O verdadeiro desafio está em saber cuidar dessa conquista com competência e compromisso, assegurando que cada pessoa possa envelhecer com dignidade, sentido e pertença.

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Natal em Instituições para Idosos

Mai 13, 2025
Natal em Instituições para Idosos: Um Momento de Inclusão e Bem-estar

O Natal é uma época de celebração, reencontros e criação de memórias, mas também pode representar desafios únicos para instituições que acolhem idosos, particularmente quando há residentes com Alzheimer ou outras condições que exigem atenção especial. Para as equipas e Direção, o objetivo é claro: proporcionar um ambiente onde todos, residentes, famílias e colaboradores, sintam o espírito natalício de forma segura, harmoniosa e acolhedora.

Dicas para um Natal Inclusivo nas Instituições

Criar um ambiente familiar e acolhedor

Manter elementos que evoquem memórias e conforto é fundamental para os idosos, especialmente para aqueles com Alzheimer. Algumas estratégias incluem:

– Decorar os espaços de forma simples, com enfeites tradicionais que estimulem boas recordações, evitando luzes intermitentes ou música muito alta.

– Incluir elementos nostálgicos, como fotografias antigas, árvores de Natal decoradas com os próprios residentes ou objetos significativos para eles.

– Assegurar que os espaços comuns estão bem organizados e acessíveis, sem alterações bruscas na disposição.

Envolver os residentes nos preparativos

A participação ativa em atividades relacionadas com o Natal contribui para o bem-estar emocional dos residentes e fortalece o sentimento de pertença:

– Organizar sessões de decoração de árvores ou criação de postais de Natal para os familiares.

– Incentivar pequenos grupos a partilhar memórias e histórias relacionadas com as festividades, promovendo momentos de convívio.

Adaptar atividades e horários às necessidades individuais

Respeitar os ritmos de cada residente é essencial para evitar a sobrecarga emocional ou física:

– Realizar atividades leves, como a audição de canções natalícias ou a visualização de filmes clássicos.

– Incluir momentos de pausa entre as atividades mais dinâmicas, permitindo que os residentes descansem.

– Criar um ambiente tranquilo para os residentes que prefiram um Natal mais introspectivo, com espaços reservados para repouso.

Sensibilizar equipas e visitantes

O envolvimento das famílias e a interação com as equipas são cruciais para o sucesso da época natalícia:

– Preparar as equipas para lidarem com situações específicas, como mudanças de humor ou ansiedade dos residentes, com empatia e paciência.

– Informar os familiares sobre a importância de interações simples e positivas com os residentes, explicando como podem contribuir para a harmonia do ambiente.

– Organizar visitas familiares em horários ajustados para garantir uma experiência calma e significativa.

Oferecer presentes com propósito

Os presentes para os residentes devem ser pensados de forma a promover conforto, estimulação sensorial e memórias:

– Álbuns de fotografias personalizados.

– Puzzles ou jogos simples adaptados às capacidades dos residentes.

– Cobertores macios, almofadas relaxantes ou objetos táteis.

– Pequenos kits de higiene ou beleza que reforcem o cuidado pessoal.

As festividades natalícias oferecem uma oportunidade única para as instituições demonstrarem o seu compromisso com o bem-estar e a qualidade de vida dos residentes. Ao proporcionar um ambiente inclusivo, caloroso e seguro, fortalecem-se os laços entre residentes, equipas e famílias, valorizando a instituição como um espaço de cuidado humanizado. Através da personalização das celebrações e do envolvimento ativo de todos os intervenientes, é possível transformar o Natal num momento inesquecível, onde a empatia, a alegria e o amor ocupam o lugar central. Afinal, mais do que uma época de grandes gestos, o Natal é feito de pequenos instantes de felicidade genuína.

Desejo a todas as instituições, colaboradores, residentes e famílias um Natal repleto de serenidade e partilha!

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Transformar os Lares de Idosos

Mai 13, 2025
Transformar os Lares de Idosos: Um Futuro Construído no Presente

Pensar os lares de idosos do futuro não significa apenas projetar novos edifícios ou implementar ideias inovadoras. Implica, acima de tudo, olhar para as estruturas existentes e adaptá-las, transformando o que temos hoje em espaços mais humanos, acolhedores e centrados na pessoa. Para que esta transformação seja real e efetiva, é necessário não apenas reimaginar os serviços e os espaços físicos, mas também promover uma mudança legislativa que permita que estas ideias avancem de forma integrada e sustentável.

Adaptar os Lares de Hoje às Necessidades de Amanhã

Muitos dos lares existentes foram concebidos com base em modelos hospitalares ou organizacionais que já não correspondem às necessidades atuais dos residentes e das equipas. O desafio do presente é requalificar estas infraestruturas, ajustando-as às exigências de um envelhecimento mais ativo, digno e integrado.

Para isso, precisamos:

Reorganizar os espaços para privilegiar uma escala mais humana, criando áreas de convivência que favoreçam a interação social e zonas privadas que respeitem a individualidade e a intimidade de cada residente.
Repensar as rotinas para que os cuidados deixem de ser apenas técnicos e passem a incluir momentos que valorizem a pessoa, promovendo autonomia e participação.
Capacitar as equipas com formação contínua em abordagens como a Humanitude, que priorizam o respeito, a empatia e a qualidade relacional.

Um Novo Olhar para a Legislação

A transformação dos lares exige, inevitavelmente, uma revisão profunda da legislação que regula estas instituições. A legislação atual, muitas vezes centrada na operacionalização de cuidados técnicos e na gestão de risco, precisa de ser complementada com um enfoque na qualidade de vida, no bem-estar e na personalização dos serviços.

Esta mudança deve incluir:

Flexibilização das normas arquitetónicas para permitir reconfigurações mais criativas e humanas dos espaços existentes.
Reconhecimento legislativo das abordagens centradas na pessoa, promovendo metodologias que coloquem o bem-estar emocional e social dos residentes ao nível da atenção técnica.
Incentivos financeiros e fiscais para apoiar a modernização dos lares existentes, garantindo que as mudanças não sobrecarregam as instituições ou os seus utilizadores.

Uma Visão Integrada para o Futuro

Adaptar os lares que temos hoje não é suficiente se não for acompanhado por uma visão a longo prazo para a conceção dos lares do futuro. A integração destas duas perspetivas – presente e futuro – requer uma estratégia nacional, em que o envelhecimento seja tratado como uma prioridade política, económica e social.

Isto inclui:

Criar parcerias com comunidades locais para que os lares se tornem espaços abertos e integrados no tecido social, promovendo interações intergeracionais e culturais.
Estabelecer padrões nacionais de qualidade de vida, que sirvam de guia para a transformação dos lares atuais e a criação de novas infraestruturas.
Envolver todos os stakeholders – residentes, profissionais, famílias e decisores políticos – num processo de consulta e cocriação das mudanças necessárias.

Liderar a Mudança com Coragem e Humanitude

Enquanto diretor, vejo a Humanitude como a bússola que orienta cada decisão. A transformação dos lares não é apenas uma questão técnica ou legislativa; é, sobretudo, um compromisso ético com a dignidade da pessoa.

Devemos liderar esta mudança com coragem, sabendo que adaptar os lares de hoje e criar os de amanhã exige esforço, inovação e um profundo respeito pelas pessoas que cuidamos. Com espaços mais humanos, uma legislação mais inclusiva e equipas capacitadas, podemos transformar os lares de idosos em verdadeiros lares de vida, onde cada residente, independentemente das suas capacidades, possa viver com alegria, conforto e sentido.

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Envelhecer não é uma doença

Mai 13, 2025
Envelhecer não é uma doença: mudar a narrativa

Vivemos num tempo em que a medicina avança, a esperança média de vida aumenta, e a longevidade é celebrada como conquista civilizacional. Ainda assim, o envelhecimento é, frequentemente, retratado como uma anomalia, uma patologia ou, no limite, uma tragédia. Esta visão distorcida não é apenas injusta: é perigosa. Envelhecer não é uma doença. É um processo fisiológico, natural e universal. No entanto, a forma como olhamos para ele continua marcada por preconceitos, medos e estigmas sociais. E é esta perceção — e não a idade em si — que “adoece” a sociedade.
Na verdade, é uma questão de linguagem… e de política A Organização Mundial da Saúde (OMS) é clara:
“O envelhecimento é um processo contínuo de acumulação de experiências e mudanças ao longo da vida. Não é uma doença, mas pode estar associado a condições crónicas que exigem atenção adequada.”
No entanto, em muitos contextos — da comunicação social às salas de espera de hospitais — as pessoas idosas continuam a ser tratadas como se fossem inevitavelmente doentes, frágeis, dependentes. A linguagem usada — “coitadinho”, “avôzinho”, “já não tem cabeça” — reforça esta ideia.
Mas a linguagem nunca é neutra. Ela molda comportamentos, expectativas e políticas públicas. Quando a sociedade acredita que envelhecer é sinónimo de decadência, tolera-se mais facilmente a negligência, a exclusão e o abandono.
Este preconceito tem nome: chama-se idadismo. É definido pela OMS como:
“Os estereótipos, preconceitos e discriminação contra pessoas com base na sua idade.”
Isto traduz-se, na prática, em:
– Subdiagnóstico de sintomas ou desvalorização da dor nas pessoas idosas;
– Ausência de investimento na formação em geriatria e cuidados continuados;
– Desrespeito pela autonomia da pessoa idosa nas decisões sobre a sua própria vida. Não é inevitável. É político.
É essencial compreender que o sofrimento associado ao envelhecimento não é sempre consequência da idade. Muitas vezes, é consequência direta da falta de políticas públicas adequadas, de recursos, de acessibilidade, de cuidados integrados. A inexistência de um Plano Nacional para o Envelhecimento digno, a falta de fiscalização nos lares, a existência de “lares ilegais” e o desinvestimento no apoio domiciliário não são tragédias naturais — são escolhas políticas. E, como tal, podem e devem ser questionadas e transformadas.
Precisamos de outra visão. Precisamos de mudar o olhar.
É urgente promover uma nova narrativa sobre o envelhecimento:
– Uma visão que reconheça o valor social, cultural e económico das pessoas mais velhas.
– Que respeite o seu direito à autodeterminação.
– Que compreenda a diversidade da velhice —há idosos ativos, outros frágeis, alguns dependentes, outros plenamente autónomos.
– Que se rejeite a infantilização, a invisibilidade e o assistencialismo.
Esta mudança começa no discurso público, mas também nas escolas, nas universidades, na comunicação e nas redes sociais. É por isso que nós, jovens, devemos falar de envelhecimento.

Devemos ser a juventude que recusa repetir o erro.
Enquanto jovem, recuso a ideia de que os direitos só interessam quando nos tocam diretamente. Recuso o silêncio cúmplice diante do abandono e da marginalização de quem envelhece.
Se hoje não lutarmos por uma velhice com direitos, dignidade e liberdade, seremos nós, amanhã, a pagar o preço.
Falar de envelhecimento não é olhar para o passado — é preparar o futuro.
É afirmar que envelhecer pode ser sinónimo de autonomia, criatividade, liberdade, amor, luta.
É afirmar que cuidar não é caridade nem voluntariado — é justiça social.
Não aceitaremos que o envelhecimento seja tratado como um erro do sistema. Porque envelhecer é continuar. E é com essa força — com a força de quem não se conforma — que as novas gerações têm o dever de garantir que continuar seja possível – com cuidado, direitos e respeito.

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A felicidade das mulheres portuguesas¹

Jan 17, 2020
“Sobre os ombros das mulheres repousa metade do Universo”
Mao Tsé-Tung

 

De acordo com a literatura de referência sobre o bem-estar subjectivo, popularmente conhecido como felicidade, este pode ser traduzido como a resposta conjunta a quatro dimensões estruturantes, a saber: o grau de felicidade, a satisfação com a vida, a avaliação do estado de saúde e o nível de conforto com que se vive. O gráfico e o quadro seguintes, sumarizam as respostas das portuguesas em cada uma delas, recolhidas pelo Inquérito Social Europeu no período compreendido entre 2002 e 2016³.

As portuguesas consideram-se mais felizes do que satisfeitas com a vida. Certamente que as condições materiais de vida não serão alheias a isso. Os mais velhos lembrar-se-ão, certamente, de uma frase conformista que se tornou popular no consulado salazarista: pobretes, mas alegretes. Com a idade, tanto a felicidade como a satisfação com a vida, decrescem ligeiramente, mas registam sempre valores superiores ao centro da escala.

Tanto a avaliação do estado de saúde como o rendimento disponível pioram significativamente com a idade. Saliente-se o decréscimo acentuado da avaliação do estado de saúde a partir dos 65 anos, é concomitante com a diminuição do rendimento disponível.

Um dado interessante sobre a percepção da felicidade, é a comparação europeia da resposta que os homens e as mulheres dão à seguinte pergunta: Considerando todos os aspectos da sua vida, qual o grau de felicidade que sente? Os resultados são claros e evidenciam dois padrões distintos: na Europa do Norte, mais igualitária, as mulheres avaliam-se como mais felizes do que os homens, sucedendo o inverso na Europa do Sul, menos igualitária. A Finlândia regista a maior diferença em favor delas e Portugal a maior em favor deles.

Não surpreende assim, relativamente às mulheres portuguesas, que Mao possa ter errado quando disse que “sobre os ombros das mulheres repousava metade do universo”, pois os dados revelam que deve ser bastante mais. Tal dever-se-á ao facto de, tradicionalmente, caber às mulheres a maior parte das tarefas domésticas e relacionadas com o cuidar. Dados do Eurobarómetro mostram que há um gap entre homens e mulheres na realização das tarefas domésticas e nos cuidados, que é comum em todos os países europeus. Elas trabalham, em média, mais horas do que eles, sendo a diferença média na Europa de 10,7 horas. Portugal está entre os países com o gap mais elevado, 13,5 horas. Ora sendo a felicidade relacional, o bem-estar dos outros – se estão doentes, desempregados, etc. – afecta a percepção da felicidade. Por exemplo, muitos dos estudos sobre o absentismo laboral, que concluem que este é mais elevado nas mulheres, escamoteiam o facto de isso se dever, precisamente, à distribuição desigual entre os homens e as mulheres, dos cuidados de saúde dos familiares. As mulheres faltam mais ao trabalho do que os homens para cuidar do companheiro, dos filhos, de outros familiares próximos, etc.

Podemos assim concluir, que a maior ou menor percepção da felicidade dos homens e das mulheres não é uma questão de género, mas de cultura. A tradicional preocupação com o cuidar e a divisão das tarefas domésticas não serão, certamente, estranhas à posição de Portugal, onde a educação dos rapazes e das raparigas ainda segue padrões sexistas assentes na diferença de género. Um bom exemplo é o que acontece com o tipo de prendas natalícias. Às meninas oferecem-se bonequinhas, cozinhas, etc. e aos meninos, carrinhos, bolas, etc. É como se de muito pequeno se prescrevessem os papéis de género no futuro: elas em “casa” e eles na “rua”. Ou como canta Sérgio Godinho: é “de pequenino que se torce o destino”.

¹Publicado na Revista [Sem] Equívocos nº 12, Outono 2019
²Sociólogo e professor universitário (rui.brites@outlook.com)
³Rounds 1 a 8. Em Portugal os dados do round 8 foram recolhidos apenas em 2017.

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Perfil de Valores dos Participantes 2019

Jul 18, 2019

VALORES HUMANOS

De acordo com Schwartz¹, os valores possuem uma estrutura hierárquica e expressam “metas motivacionais que se diferenciam, precisamente, pelas metas que expressam”. A tipologia de valores humanosusado no ESS, que tem como base o “Inventário de Valores Humanos” proposto pelo autor, contém 21 indicadores constitutivos de dez tipos de valores motivacionais básicos – «transituacionais» – agrupados em quatro valores de ordem mais elevada que se diferenciam entre si pals metas e interesses que perseguem.

 

VALORES DE REALIZAÇÃO PESSOAL

 

Representações sobre o Prestígio Pessoal, Satisfação com a Vida e Felicidade

 

 

 

 

 

 

Rui Brites 1

¹ Sociólogo e professor universitário (rui.brites@outlook.com)

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